Pe. José Carlos Ferreira da Silva
Naquela casa, ninguém gritava. O silêncio era o único som que morava ali. Não havia brigas, nem abraços. A comida era servida pontualmente, cada um pegava seu prato, comia olhando para o celular, deslizando o dedo pelas redes sociais, e depois deixava a louça na pia, sem dizer uma palavra.
Era uma família modelo – no retrato da estante. Sorrindo em um parque, todos de camiseta branca. Mas dentro de casa, ninguém perguntava como foi o dia, ninguém reparava se o outro estava triste ou cansado. Se alguém adoecesse, o remédio aparecia na mesa, mas não havia quem perguntasse: “Você está melhor?”
A indiferença não chegou de repente. Foi entrando aos poucos, como poeira que se acumula nos cantos. Começou com um “deixa pra lá”, seguido de um “não é problema meu”, até que virou regra: cada um por si. Não foi raiva que os afastou, foi a falta de curiosidade. A ausência de esforço. A desistência sem anúncio.
O pai dizia: “Dou tudo o que eles precisam.” A mãe respondia: “Também tenho minhas dores.” E os filhos aprenderam a se virar sozinhos, mas não a se importar. Aprenderam que sentimento não se cobra, que presença não significa vínculo, e que às vezes, é possível sentir solidão até com a casa cheia.
A família não desmoronou. Apenas continuou existindo, funcional e fria como um eletrodoméstico. Cada um ali sabia o seu lugar – mas ninguém sabia o do outro.
No fim, o oposto do amor nunca foi o ódio. Foi isso: o nada. O não olhar. O não notar. O não se importar.
E foi assim que a indiferença virou moradora fixa. Sentou-se no sofá, deitou-se nas camas, e passou a fazer parte da mobília.