Pe. José Carlos Ferreira da Silva
Não foi só o Papa que nos deixou – foi o homem que recusou o trono dourado, mas nunca deixou de reinar no coração de quem esperava da Igreja algo mais que cerimônia. Ele andava de sapato gasto, deixou o palácio, escolheu morar na hospedaria, onde os corredores não ecoam tanto, e falava como quem olha nos olhos — mesmo que fosse de uma janela em Roma para uma praça cheia.
Francisco nos ensinou que é possível liderar sem se impor, que a fé não precisa gritar para ser ouvida e que a misericórdia pode ser mais revolucionária que qualquer reforma. Era duro quando precisava — contra a guerra, contra a fome, contra a indiferença. Mas era suave no gesto, no sorriso fácil, na mão estendida aos que sempre ficaram à margem.
Tinha um humor simples, daqueles que só os sábios carregam. Brincava consigo mesmo, ria do peso do cargo — talvez por saber que Deus ri com a gente também. Nunca se esqueceu de onde veio, de Buenos Aires, das calçadas da periferia, dos rostos sofridos que o moldaram antes de qualquer vestimenta branca.
Hoje, em um mundo barulhento e polarizado, sua ausência grita. Mas seu legado sussurra — como ele fazia — nos pequenos atos: um abraço em quem ninguém vê, uma escuta paciente, uma escolha pela simplicidade quando todos buscam palco.
Francisco não será lembrado só como o primeiro papa jesuíta ou latino-americano. Será lembrado como o homem que levou a Igreja para fora dos muros e a colocou de volta na rua, entre as pessoas.
Ele pediu: rezem por mim. Hoje, a gente reza, mas também agradece.
Ele se foi. Mas ficou com a gente.