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31.10.2016

Solenidade de Todos os Santos

A santidade, o batismo e a vivência do Evangelho


A santidade, o batismo e a vivência do Evangelho

 

A Liturgia da Solenidade de todos os santos tem sua origem na celebração de todos os mártires que deram a sua vida por causa do Evangelho. A santidade era reconhecida na vida daqueles e daquelas que venceram as perseguições e doando o seu próprio sangue, foram fiéis ao Evangelho de Cristo. Com o cessar das perseguições aos cristãos, nasce um novo tipo de santidade, isto é, a imitação de Cristo, encontrada na prática heróica das virtudes do Evangelho.  

 

A Liturgia de todos os santos traz como tema central a santidade de vida, um chamado que se recebe no batismo e que se traduz na vivência dos valores do Evangelho. Desse modo, a santidade apresentada e celebrada na liturgia, não é a de uma perfeição impossível de ser alcançada, mas um chamado e uma vocação que pertence a todos aqueles que se unem a Cristo.

 

A santidade exaltada na liturgia não expressa somente um olhar otimista sobre a vida e sobre a história, mas é um convite à esperança que não decepciona e que faz reencontrar a medida da vida a partir de Cristo. Ela não é um chamado feito, ou uma tarefa pedida a alguns poucos e valorosos heróis, mas parte integrante da vida cotidiana de homens e mulheres, pessoas de todas as idades e lugares. Este chamado à santidade é feito a todos os cristãos chamados a serem discípulos de Cristo, que sem grandes rumores e sinais, nos momentos bons e difíceis da vida, acolheram a sua vocação batismal e a vivem intensamente. Estes fazem todo o esforço possível, para, em todas as circunstâncias da vida amar a Deus e ao próximo como lhes foi pedido pelo próprio Senhor. Sendo assim, por ser essencial na vida de todos os batizados, a santidade cotidiana pode passar despercebida e, ao mesmo tempo, ser desconsiderada. Todavia, é essa santidade que faz com que o mundo seja marcado pelos valores do Evangelho, que seja cada vez mais justo e solidário, tornando-se casa de Deus e casa dos homens. Uma santidade que espalhada e, por vezes não vista, é como um bom fermento capaz de fermentar a massa, fazendo crescer o Reino de Deus no mundo.

 

No relato do texto do Apocalipse vemos uma grande multidão de cento e quarenta e quatro mil, todos os que lavaram e alvejaram as suas vestes no Sangue do Cordeiro, trazendo palmas nas mãos e com um canto novo em seus lábios. O sinal simbólico desta cena deve ser compreendido, de modo que seja vivenciado por todos os batizados. O número é o resultado da multiplicação das doze tribos de Israel pelo número dos doze apóstolos de Cristo e pelo número mil, que expressa algo incontável. Desta forma, encontra-se presente nesta multidão, que não se pode contar, todo o povo marcado pela Aliança de Deus com os seus, selada definitivamente pelo sangue de Cristo derramado na cruz. Por terem lavado as vestes no sangue do Cordeiro, isto é, terem sido mergulhados na vida nova em Cristo pelas águas do batismo que receberam, vivem como novas criaturas. Todos trazem nas mãos as palmas da vitória sobre o martírio, sinais claros de que assumiram até às últimas consequências, o batismo que receberam. Assim, unindo o texto do Apocalipse com o encontrado na carta de São João vemos indicado o caminho de união a Cristo como via para chegar ao Pai e revelá-lo ao mundo. Os batizados, chamados à santidade cotidiana, são vocacionados a marcar o mundo com o toque amoroso de Deus, deixando na vida das pessoas o suave perfume de Cristo. Deste modo, a santidade de vida não é exclusividade de alguns poucos escolhidos, mas algo que no batismo todos receberam, isto é, o chamado de, por meio da graça de Deus, serem sinais claros dos valores do Evangelho na história.

 

Na passagem das Bem-aventuranças encontrada no Evangelho de Mateus é apresentada, de modo claro, a vivência dos valores do Evangelho como caminho de santidade de vida. É importante destacar o modo como é apresentada a figura de Jesus, já que o evangelista procura descrevê-lo como o novo Moisés; pois, como este ofereceu ao povo a Lei de Deus, os Dez Mandamentos no monte Sinai, Jesus oferece as Bem-aventuranças na montanha. Deste modo, as palavras de Jesus, neste texto, fazem eco às de Moisés,  levando à plenitude a vivência da Lei de Deus, apresentando a novidade do Reino e a sua plena alegria.

 

A mensagem das Bem-aventuranças é profundamente atual e se dirige, apesar da distância temporal, aos homens e mulheres de hoje, pois questiona o nosso tempo e o modo como organizamos a sociedade, convidando-nos a uma vivência dos valores do Evangelho como caminho de santidade cotidiana. Os valores nelas contidos são eternos e evocam o que é essencial na vivência do Evangelho, seja pela experiência de fé, seja  pela sua consequência nas relações entre as pessoas. Na escuta atenta da pregação de Jesus sobre o Reino dos céus e vivendo segundo a graça de Deus é que seremos capazes de encontrar o coração da mensagem das Bem-aventuranças e vivê-las na vida cotidiana. As bem-aventuranças estão unidas entre si e por isso devem ser refletidas a partir desse elo que as une. "A felicidade dos pobres em espírito. A felicidade dos que choram. A felicidade dos famintos e sedentos por justiça".

 

A palavra pobre em hebraico é anawin, que possui não somente uma dimensão sociológica, ou seja, a de descrever os pobres, mas também indica os preferidos de Deus, aqueles para os quais o Senhor olha com uma atenção redobrada e amor infinito. O Deus de Israel se coloca ao lado de todos os que sofrem,  consolando suas dores e dando-lhes coragem nos caminhos da história. Em Cristo todas as lágrimas encontram a sua resposta, uma vez que Ele não só escutava as dores dos sofredores, como também as aliviava. A proximidade de Cristo deve ser o grande sinal para todos aqueles que se fazem próximos dos sofredores do nosso tempo, escutar as suas dores e fazê-las próprias é o grande desafio de quem deseja fazer a diferença no mundo hoje. A justiça na Sagrada Escritura está sempre unida à misericórdia divina, pois Deus é justo quando cumpre seu plano de amor. Deste modo,  ter fome e sede de justiça significa estar unido a Deus em seu projeto de amor para a humanidade e ter a esperança de que o mundo novo que tanto desejamos é possível.     

 

A felicidade dos mansos. A felicidade dos misericordiosos. A felicidade dos construtores da paz. A felicidade dos perseguidos

 

A mansidão proposta pelas Bem-aventuranças está diretamente unida ao fato de que o evangelista Mateus descreve Jesus como manso e humilde de coração, indicando aos discípulos o caminho percorrido pelo Mestre. Tal Bem-aventurança deve ser compreendida a partir da postura daqueles que se empenham na construção do Reino e são perseguidos.  Todos os discípulos de Jesus sofreram perseguições em seu anúncio do Evangelho; diante dessas situações, a mansidão deveria guiá-los. Os que agem com misericórdia alcançarão de Deus a misericórdia, indicando que existe uma nítida identificação entre a ação humana e a divina. Deus é misericordioso, por isso aquele que vive segundo a Sua misericórdia e realiza as obras da mesma se aproxima do modo de agir de Deus. Numa sociedade onde os interesses pessoais sempre ditam o modo segundo o qual nos comportamos, a atitude do Bom Samaritano é profundamente questionadora. Ele escolhe a estrada da misericórdia, quando se colocou e agiu como próximo daquele que estava caído. Sua atitude segue os passos de Jesus que se tornou para toda a humanidade o ombro solidário e misericordioso de Deus. A felicidade dos construtores da paz e a dos perseguidos está diretamente baseada no conceito bíblico de paz, que significa todo o bem, a graça, a saúde, a bênção, condições dignas de vida plena, enfim, todos os dons provenientes da bondade divina. Deste modo, a promoção da paz não se reduz a algo individual, mas uma construção comum e participativa. Promover a paz significa colocar-se ao lado de Deus, colaborar com Ele em seu plano de amor para a humanidade.

 

Ainda hoje, muitos cristãos no mundo inteiro são mortos por professarem a sua fé e por defenderem a vida em todas as suas formas. Que o Senhor continue fazendo surgir, pela força do Seu Espírito Santo, novos santos e santas, homens e mulheres sustentados pela graça de Deus e marcados por uma santidade fecunda e profética.

 

                                      Pe Andherson Franklin Lustoza de Souza

 

 

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