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03.04.2017

Domingo de Ramos


(Is 50,4-7 / Sl 21 / Fl 2,6-11 / Mt 26,14-27,66)

 

A cruz e o sofrimento - A cruz e a presença de Deus - A cruz e o amor

 

A liturgia deste Domingo de Ramos é marcada por dois momentos bastante significativos: o ingresso de Jesus na cidade santa de Jerusalém, aclamado entre cantos e palmas, como rei de Israel e o seu caminho até o calvário, culminado com a sua morte na cruz. No que diz respeito ao segundo momento, isto é, à paixão do Senhor, a liturgia apresenta uma profunda reflexão sobre o mistério da cruz de Cristo e como esse ato salvífico toca o caminho da humanidade de modo único.

 

A paixão de Cristo ocupa, em todos os evangelhos, um lugar essencial, conduzindo a todos à contemplação do sentido profundo da vida humana, suas dores e esperanças, sofrimentos e solidão. Neste sentido, na cruz do Senhor, se descortina o sofrimento da humanidade, suas angústias diante das dores sofridas, ao mesmo tempo que revela claramente a presença silenciosa de Deus junto a todo sofredor. Desse modo, a cruz é também manifestação clara do amor de Deus, que é capaz alcançar onde e como se encontram os sofredores e marginalizados, os que estão excluídos e todos os que passam tribulações.

 

A entrada triunfal de Jesus em Jerusalém, aclamado como rei dos judeus, é seguida do relato da sua paixão, crucificação e morte na cruz. O Senhor é elevado da terra e atrai para si todos os olhares do mundo, pois no Deus feito homem, morto na cruz, todo homem e mulher, todos os sofredores desta terra encontram um lugar para si. Na cruz de Cristo, não somente no madeiro da cruz, mas no sentido pleno da obra nela realizada, todos os filhos e filhas de Deus, de todos os tempos e lugares, raças e línguas sabem-se recebidos, amparados e sustentados. Ao contemplar o Cristo pregado na cruz, todos são convidados a contemplar aqueles que ainda sofrem hoje em dia, são excluídos e marginalizados, sofrem a dor do preconceito e da discriminação. Ao ouvirem as últimas palavras do Senhor, ouvir também as dores das mães que perderam seus filhos à causa da violência, aqueles que padecem as dores do desemprego e são vítimas de toda o tipo de exclusão, ouvir seus lamentos, suas dores e sentir sua solidão. A cruz de Cristo se torna lugar onde o sofrimento humano é depositado e redimido, ganha sentido redentor e é iluminado por aquele que doa a sua vida, a fim de que outros encontrem o caminho da vida eterna. Sendo assim, ao seguir os passos de Jesus, desde o seu ingresso na Cidade Santa até os seus últimos passos que levaram-no ao calvário, todos devem trazer consigo as dores deste mundo, dos homens e mulheres, da natureza e de toda a criação, para depositarem tudo isso aos pés da cruz redentora de Cristo, na qual todo o sofrimento humano é transformado em sinal de esperança, confiança e fé.

 

Ao contemplar na cruz do Senhor os sofredores deste mundo, todos são convidados a perceber que a cruz de Cristo é também lugar da manifestação clara da presença de Deus junto aos que sofrem. O evangelista faz questão de deixar nítida a presença de Deus dentro da experiência de Cristo, ou seja, do abandono e da solidão que o próprio Senhor sofrera. A cena da crucificação é descrita como um momento de trevas e solidão, no qual o Senhor clama pelo Pai e é envolvido por grandes e espessas nuvens. Em Cristo traído por seus amigos, deixado sozinho na cruz, destituído de suas vestes, sofrendo o silêncio do próprio Deus, encontram-se presentes todos aqueles e aquelas que experimentam o mesmo e dizem: Por que Deus nos abandonou? Neste lugar de grande desolação e falta de esperança, onde tudo parece estar perdido, ouve-se a voz de um centurião pagão que afirma: "Ele era mesmo o Filho de Deus". Tal afirmação enche de luz a cena marcada pelas trevas, pela morte e pela falta de esperança, trazendo à tona uma verdade indiscutível: mesmo em meio às maiores trevas e solidão Deus sempre se faz presente. A fidelidade de Deus à sua Palavra é manifestada na cruz de Cristo, quando revela a sua presença junto ao seu Filho morto na cruz, a fim de que todos os que sofrem não se sintam jamais sozinhos. Deus se faz presente junto ao sofredor, manifestando, em meio aos sofrimentos e dores, a sua presença sempre atenta, mesmo que silenciosa. Neste caso, além de ser o lugar do encontro de todos os sofredores deste mundo, a cruz de Cristo é revelação da presença de Deus junto aos seus filhos e filhas, sinal de seu cuidado e amor de Pai.

 

Por fim, a cruz de Cristo é manifestação do amor de Deus. Um amor que encontra a sua estrada para entrar na vida dos homens, percorre caminhos inesperados para se fazer presente e chega até às últimas consequências para encontrar a todos. O amor de Deus manifestado na cruz de Cristo é incansável a ponto de seguir os passos de um homem abandonado pelos seus, traído e expropriado de sua dignidade humana, para atingir os últimos de todos os tempos e lugares. Ninguém pode ser separado do amor de Deus manifestado em Cristo Jesus, já afirmava o apóstolo Paulo aos Romanos. Mesmo na morte de Jesus, onde ele se encontra solitário e mergulhado nas trevas que cobriam o céu, num inferno de angústia e dor, mesmo lá Deus se faz presente. O amor de Deus é plenamente manifestado na cruz de Cristo, pois nela o próprio Filho de Deus reúne em si todas as dores e sofrimentos humanos, a fim de apresentá-los ao Pai. Neste sentido, a cruz de Cristo não é limite ao amor, mas solidariedade com os que sofrem, confiança no poder do amor de Deus, que se deixa crucificar pelo próprio amor dirigido à humanidade.

 

Assumir essa verdade da cruz, como manifestação plena do amor de Deus, significa assumir para si uma nova lógica que nasce na cruz de Cristo; uma lógica baseada nos valores da oblação e da entrega, de uma vida doada e da partilha, de um amor renovado e da solidariedade com os que sofrem, um amor que se abaixa para atingir e alcançar os que estão humilhados no caminho da vida. Desse modo, a vida ganha um sentido de eternidade, pois a cruz de Cristo abre as portas da vida nova para todos os que a ela abraçam e por ela vivem. Os olhares ganham um novo brilho e são direcionados pelo amor que a cruz manifesta, um amor que sabe acolher e respeitar, levantar o caído e ajudá-lo a caminhar, sustentar os fracos e defender a vida dos que se encontram em situação de risco. Assim, ao abraçar a cruz do Senhor, ao receber o seu amor sem limites, todos os que celebram essa liturgia são convidados a escolher viver a vida marcada pelo amor de Cristo e por suas escolhas. Todos devem ser capazes de reconhecer o Senhor naqueles que encontram no caminho da vida, como ele mesmo diz: "Eu tive fome e me destes de comer, tive sede e me destes de beber, era estrangeiro e me acolhestes, estava nu e me vestistes, doente e preso e viestes me visitar".

 

Que a liturgia deste Domingo de Ramos, que introduz a Semana Santa seja marcada pela acolhida de Cristo Rei, aquele que segue firme o seu caminho em fazer a vontade do Pai. Unidos a ele, até a sua morte de cruz, todos sejam levados a contemplar no Senhor morto as dores e sofrimentos deste mundo. Abraçando a cruz, sintam-se envolvidos por um amor sem limites, que ultrapassa toda a compreensão e todo entendimento humano, que é o amor infinito de Deus. Tocados pelas dores deste mundo e marcados de forma profunda pelo amor de Deus, manifestado na cruz redentora de Cristo, todos se tornem, pela graça de Deus, sinais visíveis do amor divino, que ultrapassa os tempos e chega hoje a cada um de nós.

 

Pe Andherson Franklin Lustoza de Souza

 

 

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