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20.02.2017

8º Domingo do Tempo Comum


(Is 49,14-15 / Sl 61 / 1Cor 4,1-5 / Mt 6,24-34)

 

A confiança em Deus - A liberdade de vida - A busca do Reino e da sua justiça

 

A liturgia deste domingo traz um convite muito claro e direto dirigido a todos os cristãos, a fim de que depositem toda a sua confiança nas mãos de Deus e em seu amor de Pai. Ao fazer tal experiência de grande abandono nas mãos de Deus, o fiel é chamado a viver de forma livre, deixando para trás as amarras que o prendem, de maneira especial, ao dinheiro e ao desejo de acumular bens. Por fim, Jesus oferece aos seus discípulos um caminho no qual, a partir dessa liberdade de vida, deveriam seguir, isto é, buscar o Reino e a sua Justiça.

 

       A primeira leitura do profeta Isaías se une diretamente ao salmo e ao evangelho, quando propõem uma tranquilidade de vida baseada na confiança em Deus. Nas palavras do profeta vemos retratado o amor de Deus numa maravilhosa comparação com o amor de uma mãe amorosa que se preocupa diligentemente com os seus filhos. A comparação se aprofunda, quando afirma que, mesmo na possibilidade da ausência do amor materno, o amor de Deus jamais deixaria de ser doado aos seus filhos. Tal prova de amor dada ao filhos é uma resposta a uma pergunta universal e que, de certo modo, pode povoar a mente e o coração de todos: O Senhor me esqueceu? O Senhor me abandonou? Essa experiência humana de sentir-se solitário e abandonado, principalmente nos momentos de dor e dificuldades, é algo muito presente nos tempos atuais. A possibilidade da solidão é algo que habita o coração das pessoas, que se apavoram com a ideia ou a possibilidade de pensar que podem, por um minuto que seja, estarem sós. Neste caso, tanto a leitura quanto o salmo procuram dar uma resposta a essa sensação que, por vezes, pode paralisar as pessoas, roubando-lhes algo que é fundamental para os discípulos de Cristo: a confiança que nasce na experiência de fé. O salmista canta a certeza de ter encontrado em Deus o seu refúgio; isso não significa que não tenha sido provado em sua vida e que não tenha experimentado a solidão própria dos dias difíceis. Ao contrário, a sua afirmação é fruto de uma profunda intimidade com Deus e uma amizade crescente com ele, sem a qual seria impossível que ele vivesse na confiança expressa nas palavras do salmo. Sendo assim, a confiança nos cuidados de Deus está diretamente relacionada com a experiência de fé e cresce, por conseguinte, com o aprofundar dessa relação de intimidade com Deus.

 

       O evangelho confirma a proposta da leitura e do salmo, quando apresenta Jesus convidando a uma profunda confiança no Pai. Ele pede aos seus que deixem para trás o afã inútil de se preocuparem em demasia e requer deles uma confiança naquele que faz crescer, embeleza os lírios e dá alimento aos pássaros. No caso do evangelho, a palavra de Jesus traz algo que é fundamental em relação à confiança, que é o fato de ela ser fruto da fé, isto é, são os pagãos que se preocupam,e não os que conhecem e têm fé em Deus. Neste sentido, a confiança em Deus nasce no coração daquele que amadurece na fé, daquele que nas provações firma os passos no caminho do discipulado e, por isso, se vê fortalecido e confirmado por aquele que o chamou ao seguimento. Sendo assim, cresce na confiança o que aprofunda a fé, aquele que não abandona o caminho nas provações, mas permanece fiel na certeza de que o Senhor não o abandona jamais.

 

       Um fruto importante da confiança em Deus e da relação com ele no caminho de seguimento de Jesus Cristo é a liberdade de vida, algo tão necessário para o mundo de hoje. No evangelho, Jesus é direto ao afirmar que não se pode servir a dois senhores, referindo-se a Deus e ao dinheiro. Não é possível passar ao largo dessa palavra tão direta e clara, principalmente no momento atual, onde a ganância e o desejo de possuir a qualquer custo estão na ordem do dia. Quando se fala de dinheiro, não se toca somente em questões éticas, mas também existe uma dimensão de fé na forma como se lida com o que se possui e o que se deseja possuir.  Neste caso, a relação do homem com o dinheiro está unida à forma como ele vê a própria vida e o seu lugar no mundo, suas expectativas e a fé que nutre em seu coração.

 

       Na Sagrada Escritura, os bens eram sinal da bênção divina, e aqueles que os possuíam eram chamados, a reconhecê-los como dom de Deus. A relação proposta por Jesus no evangelho não tira dos bens esse caráter de bênção, mas deseja tornar clara a postura daqueles que colocavam, no desejo de possuí-los; a sua razão de viver. A sociedade atual valoriza a posse dos bens e reconhece as pessoas por meio daquilo que possuem, tal postura está na raiz dos grandes conflitos sociais que foram vistos recentemente. Quando se reconhece o outro pelo que possui e não a partir de sua dignidade humana, a necessidade de possuir, a qualquer custo, move as atitudes e desejos, fazendo com que os valores sejam deixados de lado. Desse modo, se perde o que é essencial e verdadeiro para dar lugar a uma lógica das vantagens e do melhor caminho para o lucro sem parâmetros e para o total desrespeito com o outro. Tal atitude faz com que no horizonte da vida não haja mais lugar para a solidariedade e para a partilha, que deixam de habitar o coração do homem que se fecha aos outros e, por isso, também se fecha a Deus. Desta forma, a Palavra de Jesus quer colocar luz na relação necessária com o dinheiro, visto que não é possível, ainda mais hoje, pensar o mundo sem essa dimensão. Em sua proposta não existe nada de romântico ou impossível de ser vivido; ao contrário, é uma exortação direta, a fim de que tal relação seja dirigida pelo homem e não o contrário. A liberdade de vida proposta pelo Senhor está no fato de que tudo o que se possui deve ser reconhecido como bênção e deve ser colocado a serviço também dos outros. O homem livre é aquele que reconhece a graça de Deus em sua vida e vive, por meio dela, confiando na providência divina e apoiando-se no fato de que Deus cuida de seus filhos e filhas. Esta experiência de confiança e liberdade interior é um caminho no qual o homem é chamado a trilhar, para que seja capaz de reconhecer, não só o cuidado de Deus para consigo, mas ser sinal desse cuidado para com os que mais precisam. Tal atitude de vida torna o homem livre na relação com o dinheiro, pois reconhece que o que tem vem das mãos de Deus, por isso deve ser também aplicado na promoção do bem daqueles que menos possuem.

 

       A relação entre a confiança na providência divina e a liberdade do homem diante do dinheiro apontam para um aspecto fundamental encontrado no evangelho, que é a busca do Reino e da sua justiça. A vida do discípulo missionário deve ser guiada por um princípio basilar que se encontra no versículo 33 do evangelho: "buscai primeiro o Reino de Deus e a sua justiça e todas essas coisas vos serão dadas em acréscimo". O evangelista apoia o discurso sobre os bens no princípio irrenunciável do Reino de Deus. Colocar o Reino acima e antes de tudo significa que a justiça querida por Deus deve reger as ações dos homens. Num mundo onde a própria justiça e os próprios interesses estão em primeiro lugar, o evangelho convida-nos a olhar  o desejo de Deus para os seus filhos, isto é, a construção de um mundo fraterno e solidário. Neste sentido, aquele que abraça a fé em Cristo e deseja ser seu discípulo assume para si a nova lógica do Reino baseada nos valores da partilha, da solidariedade e da comunhão. A justiça do Reino é a expressão do desejo de Deus de uma vida digna e plena para todos os seus filhos e filhas e esta deve ser uma meta enraizada no coração daqueles que seguem a Cristo. Por isso, no horizonte da vida dos discípulos missionários deve estar presente o outro e principalmente aquele que mais precisa e ainda está excluído da sociedade. A grande preocupação com o acúmulo dos bens está relacionada com o medo sobre como será o futuro, de que modo se viverá. Esta é, de fato, uma preocupação justa, mas não deve tornar o cristão cego e insensível diante dos apelos presentes ao seu redor. Aquele que caminha com Cristo supera essa preocupação, não com a ausência de esforços e trabalho, a fim de que tenha boas condições para si e para os seus, mas com a confiança, pois como diz o Senhor: "não vos preocupeis com o dia de amanhã".

      

Que a liturgia deste domingo desperte no coração de todos a confiança na providência divina, que nasce no caminho de fé e intimidade com o Senhor.  Que a partir de uma liberdade sempre maior, todos os cristãos, chamados ao caminho do discipulado, se tornem sinais da justiça do Reino, vivendo por meio de uma nova lógica própria dos que seguem Jesus Cristo.  

          

Pe Andherson Franklin Lustoza de Souza

 

 

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